A ideia para o texto desta semana surgiu enquanto caminhava sozinho, num domingo ao meio-dia. E trata, justamente, sobre o ato de caminhar sozinho, em domingos, ao meio-dia. Suponho que já tenha caminhado domingos o bastante para afirmar: tenho um novo hobbie. Aliás,
"Se as portas da percepção estivessem limpas, tudo apareceria para o homem tal como é: infinito."
- J. Morrison, via A. Huxley, via William Blake
Em domingos, estes dias calmos e silenciosos, frequentemente me vejo caminhando por aí. Curiosamente, o intervalo entre a manhã e a tarde propicia oportunidades para se seguir rumo a um objetivo ou apenas esperar que o tempo passe, e durante esse tempo morto, passivo, minhas pernas têm me guiado. As ruas vazias, silenciosas, e o céu que insiste em permanecer nublado - ao menos na maioria das minhas memórias - exaltam a solidão e a melancolia. O tempo para, e o mundo é meu. A sensação de isolamento começa a dominar, mas e se não for assim? É possível que em algum momento a vida corra plena enquanto me transformo em espectador?
Ao longe, ao atravessar cruzamentos, algum ruído de missa, rádio, música - indistiguível, a essa distância -, adiciona ao ambiente um ruído tão difuso e tão humano quanto o aroma de refeições sendo preparadas por todos os lados. Há certo silêncio, que permite ouvir os sons do ambiente. A falta de atrativos permite que eu veja o que sempre esteve por ali, esperando. O tédio incita a observação, a melancolia me faz pensar, ter ideias, perceber, e o ato puramente físico de caminhar sem rumo se transforma em pensamento e introspecção. Talvez haja isolamento real deste mundo, mas não durante uma caminhada solitária em um domingo, ao meio-dia. Em um domingo, ao meio-dia, o caminhante pertence à Vida tanto quanto a Vida pertence ao caminhante, indispensáveis um ao outro. Os limites coexistem, o infinito encontra o zero, e todos os paradoxos deixam de fazer sentido. Ou talvez façam todo o sentido do mundo, mesmo que tudo e nada passem a significar a mesma coisa.
e.
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